Em julho, na revista Glamour, li o relato de uma moça chamada Fabiana Saad. Após uma concussão na cabeça na noite de réveillon, Fabiana ficou com uma sequela grave: ela não consegue mais sentir o cheiro ou o sabor das coisas. O relato tocante da moça mostra o quanto, realmente, vivemos no automático: é tão automático sentir cheiros e sabores que a gente só se acostuma a reclamar — e muito — quando são cheiros e sabores que não nos agradam. Tem dias em que a gente custa a se lembrar dos cheiros e sabores bons que permeiam nossa vida. E, se a gente se esquece deles, é um pulo se esquecer, também, de agradecer à vida por esses sentidos tão especiais.
Sei disso porque, infelizmente, vivi nesse automático por muito tempo. Sempre fui prática: evitava ir pra cozinha pra não gastar tempo, vivia cercada de produtos congelados ou, simplesmente, escolhia comer fora. Esse ano, morei no Chile por dois meses, com gente do mundo inteiro, e tive uma espécie de imersão em cozinhas alheias — e, como boa usuária do piloto automático, comecei a experiência com congelados, é claro.
Comecei observando o Gabriel cozinhar. O Gabriel é um cara aqui de BH, cidade onde moro, mas que fui conhecer só no Chile. Um desses casos de que o destino se encarrega de fazer você conhecer a pessoa. Ganhei um amigo-irmão no Gabriel; por sinal, um amigo-irmão que cozinhava muito bem. Com ele aprendi que fazer risoto, meu prato preferido, era a coisa mais fácil do mundo.
E Deus sabe o quanto eu já gastei nessa vida comendo risoto em restaurante…
Depois do Gabriel, veio a cozinha da Mandy, uma americana que me apresentou um novo conceito de bolo de cenoura; da Alex, outra americana que, por causa da sua ascendência europeia, era especialista na cozinha russa; da Ju, a brasileira que me ensinou a comer “sanduíche fitness” — e a gostar disso; do Nicolai, um romeno que pegou tudo o que tinha na geladeira, inventou uns temperos e acabou nos brindando com o arroz de forno mais delicioso do mundo; do Antonio, o italiano que nos ensinou a comer espaguete de maneira apropriada (existe técnica pra isso!); do Primo, o suíço que gastou quatro horas pra fazer um molho de tomate que, se você nunca conhecer o Primo, provavelmente não saberá o que é um molho de tomate de verdade… e por aí vai.
Comecei, lá mesmo, a me aventurar. A falta de ingredientes foi um grande problema, mas isso só aumentou a minha vontade de voltar e arrasar na cozinha.
Até então, quando eu ia pra cozinha, eu tinha uma especialidade só: a lasanha. Verdade seja dita: tudo era pronto já, da massa ao molho, e eu só montava. Mas já tinha feito alguns molhos de queijo pra macarrão que tinham ficado bons. Mas esses não eram pratos que eu poderia servir para a presidente da República ou a rainha da Inglaterra, então não contam. Mas eufui pegando o jeito e tentando fazer as coisas novas que eu tinha aprendido. O sanduíche fitness. A sopa russa. O arroz “turbinado”.
O risoto.
Sou louca por queijo, então meu primeiro risoto não poderia ser diferente. Lembrei do que vi na cozinha do Gabriel, mas peguei uma receita da internet só pra ter certeza. Por trabalhar com a São Vicente há um tempo, já sabia que podia contar com a marca para 50% dos tipos de queijo de um risoto aos quatro queijos. Aqui vale contar que eu aprendi a apreciar queijos finos (e a entendê-los) depois desse trabalho. Por isso, não tive medo quando vi que o risoto levaria quase 200 gramas de Brie e 200 deGorgonzola, dois queijos únicos, de sabor marcante. Se eu não conhecesse queijos finos com certeza temeria essa mistura. Ainda bem que passei a conhecer, pois essa dupla é maravilhosa. ❤
A primeira coisa que me lembro do primeiro risoto é sentir o cheiro da cebola esquentando na manteiga. Depois, o vinho caindo no arroz já quente, com o vapor subindo cheio de sabores a descobrir. Eu, que nunca tinha cortado uma cebola na vida. Eu, que não sabia até outro dia o que era uma “redução” ou um “crispy”. Eu, rainha dos congelados, estava descobrindo o cheiro e o sabor de uma comida feita por mim, com afeto e com cuidado.
Eu não sei, sinceramente, qual é o sentido da vida. Mas dos cinco sentidos que a gente tem na vida, com certeza o paladar e o olfato são dois que fazem tudo ter mais cor, mais textura, mais som de poesia. Mais graça.
A receita do risoto (que você pode ver aqui) fez sucesso. De lá pra cá, confeccionei uns seis pratos, sempre pra comer com gente especial. Fiz risoto de queijo para o meu namorado (que não curte queijo desse tanto, mas lambeu o prato em todas as vezes), para os pais dele, para os meus pais, para as minhas amigas de faculdade, para os amigos que ganhei do meu namorado, para mim mesma. A experiência rendeu fotos ótimas mas, principalmente, momentos únicos.
Só quem se aventura de peito aberto na cozinha sabe o valor de ver alguém dizendo que sua comida é gostosa. Eu sempre disse para as pessoas: sua comida é maravilhosa! Mas estava tão no piloto automático que não era capaz de perceber o quanto isso representa uma alegria para quem ouve…
Das experiências que tive esse ano com a cozinha, tirei muitas lições.
A primeira é que cozinha é o espaço da casa que traz mais amigos pra perto. É na cozinha que a mágica acontece, e não só alquimia própria das receitas, mas também a dos relacionamentos. Sempre pensei que quem cozinhava ficava sempre sozinho. Mas não: por lá, cada um pega seu vinho, cerveja ou suco e, enquanto alguém comanda as panelas, o papo rola solto. E todo mundo se ajuda.
A segunda lição é a de que quem cozinha não lava a louça (pelo menos aqui em casa!), então o chef fica sempre com a parte mais divertida. 🙂 Mas isso não significa que a pessoa que vá lavar a louça tenha que ficar lá, sozinha. Apoio moral é sempre bom!
A terceira: qualquer pessoa é totalmente capaz de fazer exatamente o que quer. Risoto é meu prato preferido, e eu sempre tive medo de tentar e fracassar. Por isso, pagava o quanto fosse para comer os melhores risotos nos melhores restaurantes sem saber que poderia fazer em casa, e dar meu toque especial a cada estilo diferente desse prato, que é bem flexível. Hoje saio, sim, para jantar risoto, mas minhas expectativas aumentaram muito, então é bom o restaurante ser ótimo! 😉
E, se o orçamento estiver apertado, não preciso morrer de vontade. Sei que vou pra cozinha fazer meu risoto e me sair muito bem. Mais do que isso: posso sempre inventar mais formas de fazê-lo.
Hoje, eu tenho um prato especial para servir a presidentes e rainhas, se vierem me visitar. Mas quer saber? As verdadeiras autoridades na minha casa são meus amigos e família que me contam, cheios de carinho, que o risoto estava uma delícia. E, com a autoridade que eles têm dentro do meu universo particular, seria loucura duvidar do meu potencial recém-descoberto. 😉
*O texto de hoje foi escrito pela Laís Menini, da Tea With Me, empresa que colabora com a São Vicente. Caso você queira conhecer nossa empresa e produtos,visite o nosso site. Quer ver sua história aqui, no nosso canal? Mande um e-mail para queijosaovicente@gmail.com e nos ajude a construir um mundo com muito mais graça, sabor e sentido.